Análise: Cricket: Jae’s Really Peculiar Game

Introdução

Cricket: Jae’s Really Peculiar Game é um RPG por turnos criado pelo estúdio indie Studio Kumiho. O jogo destaca-se por abordar temas emocionais profundos, como a depressão infantil e o luto, ao mesmo tempo que entrelaça esses temas com elementos completamente excêntricos e surreais. A história segue Jae, um rapaz que vive sozinho após a morte da sua mãe, e o seu melhor amigo Zack, numa aventura que mistura emoção com situações absurdas. Apesar do orçamento modesto e das inspirações claras de jogos como Earthbound e Paper Mario, Cricket consegue surpreender com uma narrativa cativante e um sistema de combate desafiante. Este é um daqueles títulos indie que se arrisca a passar despercebido, mas que merece atenção por tudo o que faz bem.

Jogabilidade

O combate em Cricket: Jae’s Really Peculiar Game é baseado num sistema de turnos que, à primeira vista, parece bastante tradicional. À medida que se avança no jogo, o combate começa a revelar mais profundidade, especialmente com a introdução de novas personagens e habilidades. O sistema lembra muito o de Paper Mario, com inputs cronometrados que permitem aumentar o dano ou reduzir o impacto dos ataques inimigos. No entanto, em Cricket, os timings são um pouco menos previsíveis, o que adiciona um nível de desafio e mantém as batalhas envolventes mesmo nas lutas mais simples.

Uma das mecânicas mais interessantes é o sistema Tide, um medidor que se enche à medida que o jogador executa bem as suas ações. Este medidor pode ser utilizado para aumentar o poder dos ataques ou até para desacelerar o tempo e ajudar a acertar nos inputs durante batalhas mais difíceis. O sistema Tide não revoluciona o género, mas adiciona uma camada estratégica ao combate que é fundamental, especialmente contra alguns dos chefes mais duros. Apesar de não reinventar a roda, o combate em Cricket é sólido e satisfatório, principalmente pela forma como cada batalha exige atenção e precisão.

Mundo e história

A história de Cricket é um dos seus pontos mais fortes, abordando temas como o luto e a depressão de forma surpreendentemente madura. A aventura começa com Jae e Zack a irem buscar flores para o túmulo da mãe de Jae, mas rapidamente se transforma numa conspiração maluca que envolve flores sencientes e uma possibilidade improvável de trazer a mãe de Jae de volta à vida. Esta mistura de temas sérios e momentos absurdos é tratada de forma magistral, conseguindo encontrar um equilíbrio perfeito entre o emocional e o cómico.

A narrativa explora o impacto da perda e a incapacidade de uma mente jovem de lidar com uma tragédia tão grande. Mas em vez de ser um jogo pesado e deprimente, Cricket consegue incorporar momentos de leveza e humor, como uma batalha contra um peixe-estrela robótico gigante ou uma invasão a uma base de tubarões sencientes. A capacidade de alternar entre esses momentos sem parecer forçado ou desconexo é um dos grandes trunfos do jogo. A viagem ao longo da narrativa de Cricket é envolvente e única, tornando o jogo uma experiência memorável.

Grafismo

Visualmente, Cricket: Jae’s Really Peculiar Game parece uma produção saída diretamente de uma série de animação da Cartoon Network. A utilização de cel shading e animações impecáveis dá ao jogo um aspeto vibrante e cartoonesco que encaixa perfeitamente com o tom da história. Cada cenário parece ter sido desenhado com cuidado, e a variedade dos ambientes por onde Jae e o seu grupo passam é impressionante.

O estilo gráfico leve e divertido ajuda a suavizar os momentos mais sombrios da narrativa, criando uma sensação de estar a participar numa série de episódios animados. Cada novo local que se explora parece ter a sua própria identidade visual, e o design das personagens e inimigos é igualmente criativo. Apesar de o jogo não possuir o polimento gráfico de títulos de grande orçamento, a direção artística compensa amplamente, tornando Cricket uma experiência visualmente atraente e única.

Som

O trabalho sonoro em Cricket é um complemento perfeito para os seus visuais e narrativa. A banda sonora alterna entre temas mais leves e momentos musicais mais emocionais, adequando-se sempre ao tom do jogo. Nas cenas mais absurdas, a música adota um estilo eclético e divertido, criando a atmosfera certa para as situações malucas em que os personagens se encontram.

Nas sequências mais emocionais e introspectivas, a banda sonora sabe desacelerar e criar o ambiente certo para refletir o estado emocional de Jae. Isto contribui imensamente para a imersão no jogo, ajudando o jogador a conectar-se com a jornada emocional do protagonista. No geral, a música e os efeitos sonoros de Cricket são extremamente eficazes em reforçar o tom variado da narrativa, desde o absurdo até ao profundamente tocante.

Conclusão

Cricket: Jae’s Really Peculiar Game é um excelente exemplo de como os jogos indie podem oferecer experiências profundamente envolventes, tanto a nível emocional como jogável. A confiança com que o jogo mistura uma narrativa sobre luto e depressão infantil com sequências completamente disparatadas é admirável, e a forma como isso se reflete no sistema de combate e nas mecânicas de jogo mantém o jogador sempre envolvido.

Embora a exploração no jogo seja talvez o seu ponto mais fraco, sem muito conteúdo adicional para motivar o jogador a explorar, este aspecto não tira brilho ao conjunto. O foco na narrativa e no combate mantém a experiência centrada e coesa. A comparação com Earthbound não é descabida, mas Cricket brilha por direito próprio, oferecendo uma aventura única que se destaca num ano repleto de lançamentos de grandes produções.

Cricket: Jae’s Really Peculiar Game é uma surpresa refrescante, combinando humor, coração e profundidade numa mistura rara de entretenimento leve e introspecção emocional. Num mundo de RPGs de grande orçamento, este título indie destaca-se como uma experiência que vale a pena explorar.

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