Análise: Bloodless

Introdução

Bloodless é um jogo desenvolvido pela Point N’ Sheep e publicado pela 3D Realms que apresenta uma proposta interessante e inovadora dentro do género de ação. Coloca-nos no papel de Tomoe, uma ronin desonrada que retorna à sua terra natal apenas para a encontrar devastada pela violência. A particularidade de Bloodless está no seu conceito único de não derramar uma única gota de sangue durante o jogo, uma escolha que não é só moral mas também mecânica, orientando toda a jogabilidade para uma abordagem de desarme e defesa em vez do típico combate letal. Embora seja um jogo com ideias muito originais, Bloodless também tem as suas falhas. Alguns elementos do design, como o sistema de ondas de inimigos, trazem frustração em momentos cruciais. No entanto, para aqueles que procuram uma experiência diferente, com um desafio mais reflexivo e centrado em padrões de combate e estratégia, o jogo oferece algo único e cativante. Esta análise vai explorar os vários aspetos de Bloodless, desde a jogabilidade até à apresentação visual e sonora, passando pela narrativa e pelo mundo que nos apresenta.

Jogabilidade

A jogabilidade de Bloodless é o aspeto central que diferencia este jogo de outros títulos de ação e aventura. Inspirado por jogos como Sekiro, o combate é altamente técnico e baseado na defesa e contra-ataque. Ao contrário de muitos jogos de ação, Tomoe não mata os seus adversários, preferindo desarmá-los e afastá-los do combate. O núcleo da jogabilidade gira em torno de um sistema de contra-ataque onde o jogador deve sincronizar os seus movimentos para desviar ou bloquear ataques, usando uma mecânica de dash para se esquivar e ripostar no momento certo.

Cada inimigo tem uma barra de postura que deve ser quebrada para os atordoar, permitindo um contra-ataque mais eficaz. No entanto, esta abordagem requer uma análise constante dos padrões de ataque dos inimigos, que variam em estilo e intensidade. Alguns inimigos mudam de fase à medida que os vamos desgastando, introduzindo novos padrões de ataque que tornam os combates desafiantes. Adicionalmente, o jogo penaliza bastante o jogador por falhar ao introduzir uma mecânica de stamina muito restritiva, onde desviar e contra-atacar consome rapidamente os recursos disponíveis. Um dos maiores problemas de Bloodless reside nas secções de ondas de inimigos, onde o jogo parece perder o equilíbrio. O movimento da personagem, que já é ligeiramente rígido, torna-se uma desvantagem quando enfrentamos múltiplos inimigos com ataques à distância ou habilidades difíceis de evitar. O auto-aim, que deveria ser uma ajuda, por vezes atrapalha mais do que ajuda, ao direcionar os ataques para inimigos indesejados, o que pode resultar na perda de uma oportunidade de finalizar um adversário atordoado.

Mundo e história

O mundo de Bloodless situa-se em Bakugawa, uma terra dominada pela tirania do Shogun Akechi, antigo mestre de Tomoe. A narrativa do jogo segue o regresso desta ronin à sua terra natal após um longo exílio, apenas para descobrir que a sua ausência levou a uma espiral de violência. A história toca em temas como o ciclo da violência, a honra e a redenção, com Tomoe a tentar restaurar a paz sem recorrer à violência, mesmo sendo constantemente atacada pelos seus antigos aliados e pelo povo que a considera desonrada.

O enredo, embora simples, tem profundidade suficiente para manter o jogador interessado, especialmente devido ao desenvolvimento de Tomoe como uma personagem que luta com os seus próprios demónios. Um dos elementos mais intrigantes da narrativa é a relação de Tomoe com o seu sobrinho, que agora se tornou um assassino ao serviço de Akechi. Esta dinâmica familiar, juntamente com o dilema moral de Tomoe em escolher o caminho da não-violência, confere à história uma camada emocional que a diferencia de outras narrativas de jogos de ação. Apesar de não ser uma história particularmente longa ou complexa, Bloodless consegue transmitir de forma eficaz a sensação de um mundo em decadência, onde o jogador sente o peso das suas ações, mesmo quando opta por não matar. No entanto, falta algum desenvolvimento no que toca ao mundo em si. Existem poucos personagens secundários memoráveis ou interações significativas que aprofundem o lore de Bakugawa, o que é uma oportunidade perdida para expandir o impacto da história.

Grafismo

Visualmente, Bloodless é um jogo impressionante. O seu estilo gráfico em preto e branco com salpicos ocasionais de cor é uma escolha estética ousada que funciona muito bem na maioria dos casos. Esta paleta minimalista destaca as ações no ecrã, e os toques de cor são usados para indicar elementos importantes, como os ataques dos inimigos ou as áreas de perigo. No entanto, esta escolha visual também traz alguns problemas, especialmente nas secções mais caóticas de combate. A falta de contraste entre Tomoe e alguns dos inimigos pode tornar difícil seguir a ação, resultando em momentos frustrantes onde a personagem se perde no meio do campo de batalha.

A direção artística é claramente inspirada em filmes de samurais clássicos e no estilo ukiyo-e, o que dá ao jogo um charme próprio. As paisagens são detalhadas e evocam uma sensação de melancolia e desolação, refletindo bem o estado do mundo em que Tomoe se encontra. No entanto, a repetição de cenários pode, por vezes, fazer com que o jogo pareça um pouco monótono após longas sessões de jogo, especialmente quando combinado com as secções de ondas de inimigos. Ainda assim, é difícil não ficar impressionado com a forma como o estilo gráfico é usado para realçar o tema central do jogo. A violência nunca é glorificada, e a ausência de sangue contribui para a sensação de honra e contenção que define a jornada de Tomoe.

Som

O design sonoro de Bloodless complementa muito bem a sua estética visual. A banda sonora é discreta, com composições que evocam um ambiente tradicional japonês, sem nunca se sobrepor à ação ou distrair o jogador. A música ajusta-se bem aos diferentes momentos do jogo, criando uma atmosfera imersiva, mas é suficientemente subtil para não cansar o jogador durante as longas secções de combate. Os efeitos sonoros, por outro lado, são bastante impactantes, especialmente no que toca ao som dos golpes e dos desarmes. O som metálico das espadas a colidirem ou dos ataques a serem desviados dá uma sensação de peso e impacto que aumenta a tensão durante o combate. As vozes dos inimigos, embora limitadas, também ajudam a criar uma atmosfera mais autêntica, com gritos e provocações que intensificam a urgência dos confrontos.

Apesar disso, a ausência de um voice acting mais desenvolvido para os personagens principais é notável. Uma narração mais expressiva poderia ter ajudado a dar mais profundidade à história de Tomoe e às suas interações com os poucos personagens com quem se cruza ao longo do jogo.

Conclusão

Bloodless é um jogo que se destaca pela sua originalidade e pela forma como aborda o combate de uma maneira diferente do habitual. O foco na defesa e desarme, em vez da eliminação dos inimigos, é uma abordagem refrescante, e o conceito de não violência está bem implementado tanto na narrativa quanto na jogabilidade. No entanto, este conceito único também apresenta desafios que nem sempre são bem resolvidos. A rigidez do movimento, o sistema de stamina punitivo e as secções com ondas de inimigos podem causar frustração, especialmente nas fases mais avançadas do jogo.

Apesar dos seus problemas, Bloodless tem muito a oferecer aos jogadores que procuram uma experiência mais reflexiva e estratégica. O estilo visual é encantador e a narrativa, embora simples, tem momentos de grande profundidade emocional. O combate, quando bem equilibrado, oferece uma experiência recompensadora e desafiadora. No entanto, o jogo podia beneficiar de uma maior variedade nos cenários e de um polimento adicional nos sistemas de combate, especialmente na forma como lida com múltiplos inimigos. No fim de contas, Bloodless é uma experiência que vale a pena, especialmente para os fãs de jogos como Sekiro que procuram algo com um enfoque diferente. Não é um jogo perfeito, mas os seus pontos fortes superam as suas falhas, tornando-o numa escolha interessante para quem aprecia desafios táticos e uma estética visual marcante.

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