Introdução
Paper Ghost Stories: Third Eye Open é um título que tenta romper com os tradicionais moldes dos jogos de aventura e terror, apresentando uma narrativa rica e personagens cativantes, tudo num cenário envolto em mistério e cultura. Desenvolvido pela Cellar Vault Games, este jogo transporta-nos para um mundo onde o real e o sobrenatural coexistem de forma delicada. O jogador assume o papel de Ting, uma menina de seis anos com a habilidade de ver e interagir com espíritos. Esta premissa não só serve de base para a mecânica do jogo, mas também para a construção de um enredo emotivo que aborda temas como a infância, o medo do desconhecido e a busca por respostas num ambiente culturalmente distinto.
Enquanto muitos jogos de terror focam-se em criar sustos imediatos, Paper Ghost Stories: Third Eye Open adota uma abordagem mais subtil e progressiva. A história desenvolve-se ao longo de cinco anos cruciais da vida de Ting, oferecendo ao jogador tempo para se familiarizar com o mundo e as suas regras, antes de mergulhar em momentos mais tensos. A forma como o enredo é construído, aliado a uma forte ligação às tradições e folclore do Sudeste Asiático, resulta numa experiência que se distingue das produções convencionais do género.
Jogabilidade
A jogabilidade de Paper Ghost Stories: Third Eye Open pode ser descrita como simples, mas eficaz. O jogo centra-se na exploração e interação com o mundo ao redor, movendo-se por diferentes locais e conversando com as várias personagens que habitam a cidade de Ting. As tarefas que o jogador realiza são maioritariamente lineares, o que faz com que a progressão da história seja guiada e sem grandes desvios. Embora esta estrutura linear possa parecer limitada a alguns, o jogo compensa através de atividades variadas que quebram a rotina e mantêm o jogador envolvido.
Entre as atividades encontram-se minijogos relaxantes, como cozinhar ou jogar berlindes, que proporcionam uma pausa nos momentos mais intensos da narrativa. Estes momentos de descompressão são bem-vindos, especialmente porque permitem ao jogador refletir sobre os eventos recentes antes de voltar à tensão crescente da história. Para além disso, o jogo também apresenta desafios inesperados, como quick time events e enigmas matemáticos, que surgem nos momentos mais inesperados. Estes elementos ajudam a manter a experiência fresca e acrescentam alguma profundidade à jogabilidade, evitando que se torne demasiado repetitiva.
O ponto forte do jogo não reside na complexidade dos seus sistemas, mas sim na maneira como tudo se encaixa para suportar a narrativa e o desenvolvimento da personagem principal. Ting não é apenas uma criança assustada; ela é uma personagem que cresce ao longo do jogo, e as suas decisões moldam a forma como a história se desenrola. Embora as escolhas feitas durante a maior parte do jogo não pareçam ter um impacto imediato, elas culminam num final que depende das decisões do jogador, oferecendo dois desfechos diferentes.
Mundo e história
O mundo de Paper Ghost Stories: Third Eye Open é construído com uma grande atenção ao detalhe, e a narrativa é sem dúvida um dos seus pontos mais fortes. A história gira em torno da capacidade de Ting de ver espíritos e das consequências dessa habilidade. No início, ela encontra o espírito de uma jovem chamada Xiu, e o objetivo inicial do jogo é ajudá-la a encontrar paz. No entanto, à medida que a história avança, Ting depara-se com outros espíritos que não são tão amigáveis, e o enredo começa a explorar temas mais sombrios, como a moralidade, a sanidade e a alienação.
O enredo está também fortemente ligado à cultura malaia e chinesa, o que acrescenta uma camada adicional de profundidade ao jogo. As tradições, costumes e folclore da Malásia estão presentes em muitos aspetos do jogo, desde os mercados de manhã até às lendas urbanas que ouves pelas ruas. O próprio diálogo reflete essa diversidade cultural, com a mistura de inglês, malaio e mandarim, proporcionando uma imersão genuína no ambiente. Isto faz com que o jogo não seja apenas uma experiência sobrenatural, mas também uma exploração cultural, oferecendo ao jogador uma perspetiva sobre uma sociedade que talvez não lhe seja familiar.
A narrativa de Paper Ghost Stories: Third Eye Open está repleta de reviravoltas e surpresas, o que mantém o jogador intrigado até ao final. Embora a história pareça simples no início, à medida que o jogador explora mais, torna-se claro que há muito mais em jogo do que apenas ajudar espíritos perdidos. O jogo é também uma reflexão sobre a infância, o isolamento e os laços familiares, abordando estes temas de forma sensível e respeitosa.
Grafismo
O aspeto visual de Paper Ghost Stories: Third Eye Open é sem dúvida um dos seus elementos mais distintos. Como o próprio nome sugere, o jogo adota um estilo artístico baseado em recortes de papel. Todos os cenários e personagens parecem feitos de papel, desde as árvores às casas, passando pelos próprios espíritos. Esta escolha artística cria uma atmosfera única, quase como se estivéssemos a assistir a um teatro de marionetas ou a folhear um scrapbook.
O uso de papel como elemento visual reforça a sensação de fragilidade e efemeridade, tanto no que diz respeito aos espíritos que Ting encontra como à própria infância da personagem. No entanto, apesar do charme deste estilo gráfico, o jogo apresenta alguns problemas técnicos. Durante cenas animadas ou momentos em que várias imagens se movem ao mesmo tempo, o desempenho pode tornar-se instável, causando quebras de fluidez e, por vezes, até crashes.
Outro aspeto visual que pode ser frustrante para alguns jogadores é o ângulo da câmara. Como o mundo é feito de papel, é difícil ver o que está ao virar da esquina ou numa rua mais à frente, o que complica certas secções em que é necessário evitar espíritos hostis. Embora estes problemas não sejam graves ao ponto de arruinar a experiência, podem causar alguma frustração durante momentos mais exigentes.
Som
O som desempenha um papel importante em qualquer jogo de terror ou aventura com elementos sobrenaturais, e Paper Ghost Stories: Third Eye Open não é exceção. A banda sonora do jogo é discreta, mas eficaz, criando a atmosfera necessária para manter o jogador sempre num estado de ligeira tensão. A música é usada com parcimónia, permitindo que o silêncio tenha um impacto igualmente importante em certos momentos.
Os efeitos sonoros também são bem implementados, desde os sons subtis do vento a soprar pelas folhas de papel até aos ruídos mais ameaçadores que acompanham os encontros com espíritos. Estes detalhes ajudam a construir a tensão necessária para manter o jogador sempre alerta. O jogo não precisa de recorrer a sustos fáceis, pois o ambiente sonoro, combinado com a narrativa e os visuais, é suficiente para criar uma sensação de inquietação constante.
Para além dos sons ambiente, o jogo também apresenta diálogos falados em várias línguas, o que contribui para a imersão cultural e oferece autenticidade ao mundo em que Ting vive.
Conclusão
Paper Ghost Stories: Third Eye Open é uma experiência única que combina uma narrativa emocionante com um estilo visual marcante e uma imersão cultural rara nos videojogos. Embora apresente uma jogabilidade relativamente simples e alguns problemas técnicos, a força da sua história e personagens mais do que compensam essas falhas. O jogo oferece uma visão sensível e madura sobre temas como a infância, o isolamento e as tradições culturais, enquanto nos leva numa jornada paranormal intrigante.
Para quem procura uma experiência de aventura com um toque sobrenatural e um enredo envolvente, Paper Ghost Stories: Third Eye Open é uma excelente escolha. A mistura de terror subtil, cultura do Sudeste Asiático e uma história cativante torna este título memorável e diferente de qualquer outra produção no género.